Igreja tem múmias de freiras de 200 anos |
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O Estado de São Paulo - 27.02.08 |
Igreja tem múmias de freiras de 200 anos
Dois corpos foram achados durante descupinização no Mosteiro da Luz
Sérgio Duran
A descupinização de parte do Museu de Arte Sacra, no Mosteiro da Luz, centro, levou à descoberta dos corpos mumificados de duas freiras que podem ter quase 200 anos. Segundo especialistas, um deles é o mais bem conservado já achado nessas condições no País.
A descoberta ocorreu no dia 2, sábado de carnaval. O museu estuda abrir à visitação a câmara mortuária onde os corpos foram achados e expor as múmias. Isso poderá reforçar a peregrinação ao local, já consagrado como uma das moradias de Frei Galvão, canonizado em 2007.
É quase certo que as freiras mumificadas foram contemporâneas do santo. Elas pertencem à ordem da Imaculada Concepción, fundada na Espanha, em 1484. Conhecidas como concepcionistas, eram chamadas de “filhas espirituais” pelo Frei Galvão e até hoje fabricam as pílulas vendidas com o nome do santo.
A localização das múmias foi presenciada pela diretora do museu, Mari Marino, que acompanhava no dia 2 o trabalho dos funcionários da empresa Ecopraga, contratada para a descupinização. Ao percorrer a trilha de pó deixada pelos cupins chegou-se à antiga câmara mortuária das concepcionistas.
Ali, há um pequeno altar e seis túmulos. Só um foi aberto, para verificação dos cupins. As freiras estão sepultadas lado a lado. A que está em pior estado foi achada deitada de lado, com a cabeça como que apoiada no ombro da outra. Presume-se que a cabeça tenha se inclinado por causa da decomposição mais acentuada.
No dia 22, uma comissão de cientistas abriu a sepultura e verificou o estado dos corpos. “Não podemos nem tocá-las para não contaminá-las com o nosso DNA”, disse a diretora, que fechou a capela e instalou três purificadores de ar.
Segundo Mari, até pelo menos a morte do santo as freiras eram sepultadas na câmara mortuária. Depois, passaram a ser enterradas ao lado do mosteiro. “É possível que, uma vez esgotada a capacidade de sepultamento no solo, começaram a usar a parede”, disse o superintendente paulista do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan),Victor Hugo Mori. “As câmaras não são de taipa. São em uma parede feita posteriormente, de lajotas e com abóbadas internas típicas do século 19.”
De acordo com pessoas que convivem com as concepcionistas, havia entre elas a lenda de uma irmã cujo corpo não se decompôs. Essa lenda pode ter surgido na época em que as freiras abriram o túmulo para fazer o sepultamento do segundo corpo. É impossível saber se há mais restos mortais bem conservados nos demais túmulos. Sabe-se apenas que um deles foi identificado como o da irmã Maria Caetana, de 1826.
Construído pelo Frei Galvão, o Mosteiro da Luz data de 1774. Desde aquela época, foram sepultadas 129 irmãs no local. “Os corpos mumificados serão identificados com a análise de documentos históricos das concepcionistas, sem que seja necessário exame laboratorial”, afirmou o diretor do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP, José Luiz Morais. “É uma descoberta importantíssima, porque a arqueologia brasileira até hoje trabalhou com sepultamentos indígenas e corpos em estado muito pior de conservação.”
As irmãs já se colocaram a favor da investigação científica da descoberta dos corpos. Atualmente, há 14 religiosas enclausuradas no mosteiro. Elas não se comunicam com o exterior durante a quaresma (os 40 dias posteriores ao carnaval).
A mumificação natural normalmente acontece quando corpos são enterrados em locais frios ou secos, o que inibe o desenvolvimento das bactérias responsáveis pela putrefação. “Não é um fenômeno raro, mas também não é assim tão fácil”, disse o diretor do Instituto Médico-Legal, Hideaki Kawata. No País, tais corpos são achados com mais freqüência em cavernas, criptas de igrejas e no semi-árido do Nordeste. “O cadáver fica conservado porque acontece a desidratação, mas não o apodrecimento.”
COLABOROU RODRIGO BRANCATELLI
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Jornal O Estado de São Paulo
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