|
Publicado pelo jornal Folha de S.Paulo 27/01/2004 |
Melhor prevenir que remediar. Como qualquer boa mãe sabe, e a ciência não cansa de demonstrar, a formação da pessoa começa a ser desenhada nas suas primeiras experiências de vida.
Depois de anos de descaso, comprovados por indicadores sociais, e de muito trabalho e dinheiro gastos em operações do tipo "remediar", uma mobilização que envolve vários setores da sociedade tenta fazer com que a primeira infância seja, de verdade, uma prioridade no Brasil.
Já que a ONU escolheu 2004 para ser dedicado à família, representantes de ONGs, da Justiça e dos governos federal, estaduais e municipais montam uma rede de proteção à criança brasileira de zero a seis anos. O primeiro objetivo dessa rede é capacitar neste ano 10 milhões de famílias para que aprendam a cuidar melhor de seus filhos.
O esforço para colocar essa faixa etária no foco das políticas públicas está referendado em pesquisas científicas. Estudos mostram que a atenção dada à criança nesse começo da vida é muito mais importante para seu desenvolvimento do que se imaginava até a década de 80.
Essa nova rede de proteção também se espelha em iniciativas adotadas em Cuba, no México, nos Estados Unidos e no Canadá. "O programa se inspirou nesses países para focalizar a família. A forma de atuação, no entanto, foi idealizada a partir de experiências já existentes no Brasil, como os programas de saúde da família e o trabalho da Pastoral da Criança", afirma Halim Girade, oficial de projetos do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), instituição que lidera o trabalho, apoiado pelo MEC (Ministério da Educação), a Fundação Orsa, a Unesco e a Sociedade Brasileira de Pediatria.
As famílias e os agentes que irão treiná-las receberão calendários e cartilhas com informações sobre como tratar crianças de até seis anos. A distribuição do material e a disseminação de seu conteúdo terão o apoio de agentes comunitários de saúde, médicos e enfermeiros de programas de saúde da família e possivelmente de voluntários da Pastoral da Criança.
"Estamos construindo esse material para que os pais saibam como interagir com as crianças. Uma criança que percebe que é desejada tem melhores condições de reagir bem às adversidades e de ser um cidadão mais integrado à sociedade, com mais possibilidade de sucesso", diz Girade, que atua na área de saúde e desenvolvimento infantil no Brasil.
A necessidade de políticas públicas que priorizem a população até seis anos fica evidente quando se analisam alguns indicadores sociais.
Na área de educação, o país tem uma estrutura de creches e pré-escolas que, na maioria dos municípios, não responde à demanda. Quando responde em quantidade de vagas, tem sua qualidade discutida —há especialistas que classificam as creches como "depósitos" de crianças.
Na visão de Maria Malta Campos, 63, pesquisadora da Fundação Carlos Chagas e professora de pós-graduação em educação na PUC-SP, há no Brasil um descompasso entre as conquistas na legislação e a política de financiamento à educação. "Enquanto a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e a própria Constituição consagram todo o ensino básico como prioritário, a prioridade, em verbas, vem sendo dada apenas ao ensino fundamental, e aqui se trata de uma prioridade entendida como exclusividade", critica.
Na fase conhecida como "janela de oportunidades", as competências se organizam
De acordo com essa educadora, que participa do Movimento Interfóruns de Educação Infantil, há uma grande demanda reprimida por creches e pré-escolas. "As crianças mais pobres são justamente as mais mal atendidas: em vez de compensar as desigualdades sociais, creches e escolas reforçam essas diferenças, o que é muito triste, especialmente nessa faixa de idade decisiva, quando a criança é uma 'esponja' capaz de absorver tudo. Aí, o sistema público só vai pegá-la na primeira série, quando já estará marcada por tantas oportunidades perdidas de aprendizado."
Leia a matéria na íntegra em:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/sinapse/ult1063u726.shtml
Folha de São Paulo
Para mais informações clique em AJUDA no menu.
|