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Se eu tivesse pensado nisso antes


Publicado no Site do Jornal O Estado de São Paulo de 14/06/07

Se eu tivesse pensado nisso antes ...

Fernando Reinach*

Uma coisa que todo cientista odeia é abrir uma revista científica e descobrir que um colega encontrou a solução para o problema que está tentando resolver. Associado ao prazer de ver o problema resolvido vem o sentimento de inferioridade (“como não pensei nisso antes?”) e de abandono (“o que vou fazer da vida a partir de hoje?”). Foi quase o que senti na semana passada quando me deparei com a solução de um problema ao qual dediquei três anos de minha vida. Mas, antes que esses sentimentos tomassem conta da minha mente, lembrei-me de que havia desistido de resolver o problema faz mais de 20 anos. Foi sorte, fiquei só com o prazer de ver o problema resolvido.

Quando um gene é ativado, a informação contida na seqüência de DNA é copiada em uma molécula de RNA. Essa molécula é processada antes de ser usada para produzir uma proteína. Esse processamento é chamado de “splicing”. Para entender o processo imagine que o RNA é um colar com 100 pérolas. Com a mão esquerda, segure o colar na pérola número 10. Com a direita, segure o colar na pérola 80. Se você aproximar as duas mãos, as pérolas 10 e 80 vão ficar próximas e vai se formar uma alça contendo as pérolas de número 11 a 79. Agora, se você emendar a pérola 10 com 80, cortar a linha entre 10 e 11 e também entre 79 e 80, a alça se soltará, e o colar conterá as seqüência 1 a 10 ligada à seqüência 80 a 100. Você acabou de fazer um “splicing” no seu colar de pérolas, juntando os “exons” (1-10 e 80-100) e removendo o “intron” (11-79).

Em 1984 o grupo em que eu trabalhava na Inglaterra, juntamente com outros laboratórios nos EUA, descobriu que muitos RNAs podiam ser processados de duas ou mais maneiras. Em outras palavras, a posição da alça podia variar gerando diferentes moléculas de RNA. Este processo foi denominado de “splicing alternativo”. Durante três anos tive como objetivo descobrir como o “splicing alternativo” era regulado. Levou mais de 20 anos, mas agora sei a resposta.

Os cientistas estudaram um gene envolvido na síntese da vitamina B. O que foi descoberto é que nesse gene a alça formada pelo “intron”, antes do corte e da emenda, tem a capacidade de se ligar a uma molécula da vitamina. Quando existem muitas moléculas de vitamina na célula, uma delas se liga à alça. Com a vitamina ligada à alça, o padrão de “splicing” leva à produção de um RNA incapaz de sintetizar a vitamina. Com isso, ao longo do tempo, a quantidade de vitamina dentro da célula diminui até que não exista mais vitamina para se ligar à alça. Nesse momento, a alça sem vitamina faz com que o padrão de “splicing” se altere. E o RNA formado produz uma enzima que aumenta a produção de vitamina, aumentando sua concentração.

A conclusão é que o “splicing alternativo” é provavelmente mais uma forma de regular o metabolismo nos seres vivos. Agora, além da regulação da expressão dos genes, da regulação direta da atividade das enzimas, existe um terceiro mecanismo - o “splicing alternativo”. Se a observação for confirmada, e o mecanismo existir em muitos genes, esta pode ser uma descoberta muito importante. Se eu tivesse tido essa idéia 20 anos atrás.... Pior seria se eu ainda estivesse tentando resolver o problema e agora me deparasse com a resposta.

Mais informações em Control of alternative RNA splicing and gene expression by eukaryotic riboswithces, Nature, vol. 447, pág. 497, 2007.

*fernando@reinach.com
Biólogo

http://txt.estado.com.br/editorias/2007/06/14/ger-1.93.7.20070614.6.1.xml

Jornal O Estado de São Paulo

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