Menção Honrosa - Conto
“Concerto para violino”, de Hânia Cecília Pilan
(E.E. Prof. Armando Rizzo; D.E. Votorantim; Votorantim)
Concerto para violino
Na solidão daquela sala ela tocava violino, dia após dia. Sobretudo exercícios de velocidade. Como ouvinte, apenas a velha que ficava como um zumbi, de olhos fixos na filha, sem reagir, como se não estivesse escutando a enxurrada de notas musicais.
De uma certa forma, a violinista parecia agredir a mãe, fabricando aqueles sons. E, enquanto tocava, ia lembrando do tempo em que era uma menininha obrigada a tocar, horas a fio, os exercícios de iniciação. O som que ela produzia então, mais se assemelhava a um miado de gato. Chegava a ferir os ouvidos da candidata a violinista. Mas ela não podia parar. Ai dela se interrompesse o “miado”! Às vezes, quando exausta, braço doendo, descansava o instrumento na mesa, sua mãe vinha sorrateira e batia nela com o arco do violino. Com a parte da madeira.
E quando algum parente ou vizinho vinha visitá-las, a mãe obrigava a filha a mostrar seu “talento”. De vestido branco, engomado, posicionada no centro do hall elevado da entrada, ela tinha que tocar alguma música. E ai dela se errasse em demasia! Além da descompostura que levava diante das visitas, quando sozinhas, a mãe lhe aplicava o seu corretivo preferido: batia na filha com o arco do violino. Com a parte de madeira.
Os anos se passaram e ela, a duras penas, acabou aprendendo a tocar. Com técnica, porque o amor pela música tinha se perdido entre uma surra e outra. E, sem a paixão, nunca conseguiu alçar grandes vôos. Chegou até a tocar em casamentos. Nunca em orquestras, nem mesmo em quartetos.
Agora, ela não tem, nem a paixão nem o ardor e a agilidade da juventude, mas tem que continuar tocando pra sobreviver. Tocando num restaurante húngaro, vestida de cigana e atendendo aos pedidos de gosto duvidoso dos fregueses. Trabalha até tarde, dorme até tarde também e passa as tardes fazendo exercícios de agilidade diante da mãe que, de olhos fixos na filha, fica ouvindo, imóvel. Ai dela se se mexer ou tentar falar alguma coisa !
A violinista bate na mãe com o arco do violino. Com a parte da madeira.
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