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Profª. Maria Tereza Messa Azevedo |
Aconteceu nos anos 60. Fervilhantes anos 60! Hippies, Hair, Jânio, Easy Rider, O Golpe, Os Militares, a Revolução Estudantil, Woodstok... E os Beatles pairando sobre tudo.
Pois naqueles anos 60 havia uma adolescente pobre caminhando para o trabalho numa manhã qualquer, pensando como seria bom poder ser alguém na vida, realizar sonhos, participar das coisas que aconteciam.
Tanta coisa acontecendo à volta dela! Mas pobres, ela bem sabia, ficam sempre vendo as coisas acontecerem... aos outros. Para eles resta a sensação de insignificância, de impotência, de não ser ninguém.
Tinha quatorze anos e um sonho: ser uma professora de ginásio. Nos anos 60 o professor ainda era uma figura respeitada e tinha orgulho de sua profissão. Portanto, para a menina, ser professora era um sonho mas ela não via a mais remota chance de realizá-lo. Era bem verdade que seu professor de Português vivia elogiando-lhe as redações e isso era algo a ser considerado.
Um homem de poucas palavras e raros sorrisos, era assim que a garota via o professor Alcir. Alto, magro, desengonçado, fundas olheiras atrás das grossas lentes dos óculos. Ninguém mais sem charme do que aquele professor... mas como seduzia! Naqueles dias difíceis de agitação e revolta (remember 68) era ele quem ia dialogar com os estudantes, ponderar, tentar fazer ver que "eles" eram a lei e era necessário prudência.
Caminhando para o trabalho naquela manhã de inverno, a garota pensava nas coisas que o professor tinha dito na noite anterior, última aula do ano.
Como tradicionalmente fazia, na última aula do ano, o professor punha-se à disposição para falar sobre um tema qualquer à escolha dos alunos. Naquele ano, o assunto escolhido foi... o professor Alcir: queriam saber tudo sobre ele, sua família, suas preferências, sua vida.
Ele vinha de uma família muito pobre, do interior paulista. Com dificuldade, conseguiu terminar o colegial e queria cursar Letras mas, na época, não havia na faculdade o curso noturno. Para poder cursar o diurno, ele precisava de uma bolsa de estudos e, para consegui-la, precisou apresentar um atestado de pobreza contendo assinaturas de pessoas que o conheciam. Quanta amargura havia na voz do professor ao contar a humilhação que tivera de passar, batendo à porta das pessoas para pedir que assinassem o documento!
Pensando naquelas coisas, a garota que habitualmente caminhava cabisbaixa, foi erguendo a cabeça, altaneira. Os ombros, habitualmente curvos, se aprumaram. Os olhos se abriram desmesurados para aquela coisa imensa que acabara de descobrir: ela podia! Sim, se ele, o professor, enfrentara tantas dificuldades e acabara conseguindo, por que ela não conseguiria? Ah! A indescritível sensação de poder! A vontade de gritar ao mundo: eu também posso ser alguma coisa, posso ser alguém...
Foram-se os 60... Os hippies cederam lugar aos yupies; os ideais estudantis se perderam no tempo; no lugar dos militares, temos um intelectual. Jânio tentou uma rentrée infeliz, o Woodstok reeditado foi mais infeliz ainda. Os anos dourados se foram, vieram os de chumbo.
Mas os Beatles ainda pairam sobre tudo.
A adolescente pobre e sonhadora da história é hoje uma professora.
Uma professora pobre e sonhadora. Sonha fazer com que seus alunos pobres da periferia tenham a chance de um dia dizer: eu posso!
EEPSG "Profª Neyde Apparecida Sollitto" - Capital
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