Cultura afro começa a ganhar as salas de aula |
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Publicado pelo jornal O Estado de S.Paulo 25/10/2004 |
(Renata Cafardo)
As crianças moldam com argila suas galinhas-d’angola, enquanto a professora conta a história de um ratinho que passa por savanas e florestas. Cinderela e Branca de Neve perdem espaço; os heróis agora atendem pelos nomes de Kiriku ou Doce Princesa Negra. Mais de 40% dos alunos das escolas brasileiras são negros ou pardos e a diversidade racial começou só recentemente a fazer parte das salas de aula do País. Uma lei federal exige, há mais de um ano e meio, a introdução da história e da cultura afro-brasileira nos currículos escolares.
"A intenção é incluir, ampliar e não deixar as crianças apenas com a visão européia da história", diz a diretora do Centro de Estudos das Relações do Trabalho e Desigualdades (Ceert), Maria Aparecida da Silva Bento. A ONG premia iniciativas escolares que incentivem a igualdade racial. Para ela, a discussão do tema na sala de aula pode ajudar a construir um país com menos preconceito e sem conflitos religiosos ou étnicos. "Seríamos um exemplo para o mundo."
Segundo a lei 10.639, a África não deve aparecer como uma disciplina e, sim, integrada às aulas de educação artística, literatura e história. São poucos ainda os livros didáticos que incluem o tema e a maioria dos trabalhos é feita com literatura infantil, danças e músicas. As bibliotecas das escolas municipais foram equipadas com 50 mil livros sobre cultura e história afro-brasileira.
Em novembro, o Ministério da Educação (MEC) abre concurso para livros didáticos e brinquedos educativos sobre o tema. Segundo a subcoordenadora da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC, Andréa Lisboa de Sousa, os currículos dos cursos superiores de Licenciatura devem ser adaptados. Hoje, iniciativas aqui e ali - como as das Secretarias de Educação Municipal e Estadual de São Paulo e Municipal de Campinas - capacitam os professores já formados. Além disso, o Maranhão está formulando materiais didáticos próprios para serem usados nas escolas localizadas em áreas quilombolas. É o Estado com o maior número de alunos nessas regiões: 10 mil.
FILMES E HISTÓRIAS "Eu gosto mesmo é dos bichos da África", diz Joyce da Silva Santos, de 9 anos, aluna de Maria Cecília Pinto Silva, da Escola Municipal Álvaro Silva Braga. A professora - premiada pelo Ceert - percebeu que mais de 90% das histórias que seus alunos conheciam tinham origem européia. Cecília então apresentou a eles o filme Kiriku e a Feiticeira, produzido na França e com um herói negro que salva sua aldeia da maldição de uma feiticeira. Recentemente, passou também a contar histórias que falavam da geografia, da cultura e dos povos da África.
"Os negros não foram só escravos, têm muitas histórias bonitas", diz Felipe Augusto de Sousa Silva, de 10 anos, que respondia com presteza às perguntas da professora sobre a tradição oral no continente. "Achei o Saara", gritava um colega na frente da sala, com o rosto colado no mapa.
Em outra escola, no Itaim Paulista, zona leste, as crianças passaram a receber aulas de dança, capoeira e percussão aos sábados. "Elas entenderam que essa cultura faz parte do nosso País", diz a professora Sandra Carvalho Batista, uma das responsáveis pelo projeto. Antes da lei, a legislação educacional fazia apenas mencionava a importância da pluralidade cultural nas escolas.
O Estado de S.Paulo
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