Atividade rural ajuda nas disciplinas básicas |
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Publicado pelo jornal O Estado de S.Paulo 12/12/2004 |
Alguns alunos separam a água para regar as folhas que começam a nascer na horta de plantas medicinais. Outros se agacham para tirar o mato intruso que aparece entre os canteiros. No jardim, com pequenas tesouras, as margaridas são podadas por duas meninas, que se responsabilizaram pelas flores da escola. Dentro de uma sala, sementes são secadas por alguns garotos. Tudo sob o olhar atento da professora, em uma rotina normal de aula.
Parecem tarefas simples, mas as plantações foram parte das atividades que permearam todas as aulas dos alunos da terceira e quarta série durante o ano. A idéia nasceu da observação dos hábitos dos moradores, que plantam ervas em casa para consumo próprio, baseados nas tradições populares. Enquanto camomila, hortelã, bálsamo, boldo, guaco e capim-cidreira eram apenas antigos conhecidos dos assentados, para a escola foram a oportunidade de ajudar a ensinar matemática, português, ciências e, principalmente, o hábito de pesquisar.
Com bloco de anotações nas mãos, os alunos saíram a campo para entrevistar os moradores e ouvir o que sabiam sobre o assunto. Com o material anotado, tiveram a assessoria do Instituto de Terras do Estado de São Paulo para saber exatamente as utilidades das plantas e como elas poderiam ser manipuladas. "Na aula de ciências, foram pesquisar os cientistas que trabalham com elas, os nomes científicos, os usos pela medicina. Em português, treinaram ortografia e gramática, porque tiveram de produzir um caderno com o que aprenderam. Em matemática, aplicaram as noções de cálculo e geometria para construir os canteiros", explica a professora Carla Regina Jellmayer, da escola Pedro Morganti, no assentamento Bela Vista, um dos três do município de Araraquara. "Depois, ainda aprenderam a secar as folhas para fazer sachês e a produzir sabonetes, xampus e essências", complementa.
Para os mais velhos, o trabalho de campo é mais amplo. Saem da aula de geografia ou de ciências e vão estudar no próprio assentamento, amparados por um roteiro de entrevistas elaborado com o professor. Observam vacas, galinhas, porcos, plantações de milho, arroz, fazem perguntas e na volta apresentam um relatório do que viram e ouviram.
"Tem muitas coisas que a gente tem aqui que não tem na cidade. Lá, eu tinha que ficar em um lugar só, não podia falar nada. Aqui a gente aprende o porquê das coisas que vê por aí", conta Brenda Lais dos Santos, de 10 anos, que chegou a estudar durante um ano na escola da cidade.
MEDIAÇÃO
Além do trabalho com a terra, a escola tem uma cozinha experimental, um laboratório de informática, biblioteca e uma cooperativa, que funciona como projeto de conclusão da oitava série. "Na cozinha eles entendem como funcionam alguns processos que vêem em casa. Por exemplo, como fazer queijo, esterilizar objetos", diz a coordenadora pedagógica da escola, Rosemeire Botello Costa. "Já a cooperativa é para ensiná-los a trabalhar em grupo, a dividir as tarefas e responsabilidades. Meninos e meninas cozinham, lavam e arrumam, para crescer sem preconceitos."
No entanto, apesar de trabalhar e valorizar a cultura do campo, a escola também faz a mediação entre o mundo urbano e a realidade rural. Numa vila de assentados em que não há supermercados, lojas, farmácias, livrarias ou qualquer outro tipo de comércio, a biblioteca e os computadores são a porta para um mundo até então inacessível. "Nunca tinha mexido no computador. A aula de informática é a de que eu mais gosto. Dá para fazer pesquisa e brincar com os joguinhos", diz Benoni Luis Nogueira, de 10 anos.
O Estado de S.Paulo
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