"Os alunos do noturno estudados eram geralmente
acusados de ser os principais responsáveis pelos estragos
das instalações. "Rebeldes", "irreverentes",
"irresponsáveis", "preguiçosos",
"vândalos", eles ocupavam o espaço
escolar de modo diferenciado em relação aos
alunos dos outros períodos. Instalados no mercado de
trabalho, junto ao setor terciário e com baixa remuneração,
eles afirmaram gostar da Escola como um lugar "onde todos
se encontram"."
"Apesar do controle institucional que permeava as
duas escolas, uma delas, ao valorizar os "pequenos nadas"
do seu cotidiano - como poder ficar conversando com os colegas
no final das aulas; ocupar a quadra, mesmo após o expediente;
colocar música no recreio etc. -, permitia, acredito
que mesmo sem o saber, a expressão desse desejo irreprimível
de "estar-junto" a partir e em torno de um território.
Na outra Escola, por sua vez, os próprios alunos se
encarregavam de dificultar o êxito completo da dominação
a que estavam submetidos, através da formação
de turmas, das brigas, das depredações, enfim,
de toda ação que lembrasse a eles a necessidade
de não sacrificar o sentimento que os unia enquanto
grupo. As camisetas das gangues, com seus emblemas, seus versos,
as tatuagens marcavam no corpo, e igualmente em todos os corpos
do grupo, a recusa da Escola enquanto instituição
uniformizadora."
"As observações feitas nas salas de
aula, nos recreios mostraram a existência de um todo
em movimento que ocorria juntamente com um sentimento de conjunto.
Quando havia espaços intersticiais, por onde se manifestavam
os excessos, o monopólio total da instituição
se enfraquecia. A depredação, as brigas entre
os próprios alunos expressavam também a necessidade
que tinham de viver intensamente aqueles poucos momentos que
se opunham à monotonia da sala de aula.
A "transgressão" dos alunos era explicada
pelos professores através de fatores externos à
Escola, mas eu arriscaria afirmar que parte dessa "transgressão"
seria determinada pela maneira como a ordem era administrada
pela instituição."
"Ressaltamos, finalmente, que qualquer proposta educacional
deve levar em consideração as características
da comunidade escolar, evitando a reprodução
cega de experiências, que, embora bem-sucedidas, podem
não corresponder às necessidades do grupo com
o qual convivemos."